Contra-Alegação
Tribunal
Judicial da Comarca de Tondela
1ºJuizo
Cível
Processo
nº 1985/17
Meritíssimo(a)
Juiz(a) de Direito
Tribunal
Judicial da Comarca de Tondela
KABI
NA DEBÉ, Réu/Recorrido melhor identificado nos autos, cujo
Autor/Recorrente é ANTÓNIO
QUETA JR,
tendo
sido notificado pelo mandatário do A.,
da interposição, pelo mesmo, de Recurso de Apelação da Douta Sentença proferida
nos Autos, assim como do Despacho Saneador, vem a luz do estipulado nos artigos
684º-B e 685º/5 ambos do Código do Processo Civil, doravante CPC, apresentar as
suas CONTRA-ALEGAÇÕES.
E.D.
O
Advogado
(Assinatura
electrónica)
Junta:
comprovativo
da notificação à parte contrária do requerimento e contra-alegações, nos termos
dos artigos 229º-A e 260º-A do CPC, e comprovativo do pagamento da taxa de
justiça autoliquidada através de DUC, nos termos dos artigos 6º/2 do RCP e
Tabela I-B anexa. Ainda faça constar que o artigo 152º/7 do CPC potencia o R. a
não apresentar ou fornecer duplicados.
EXMOS.
SENHORES DESEMBARGADORES
DO
TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA
KABI
NA DEBÉ, Recorrido nos presentes autos, vem apresentar as suas
CONTRA-ALEGAÇÕES
O que faz nos termos dos
arts. 684º-B e 685º/5 do CPC e com os fundamentos que se seguem:
Vem o recurso interposto
da decisão do tribunal de 1ª instância que julgou acção totalmente
improcedente, por não provada, e nessa esteira absolveu o Réu de todos os
pedidos que, contra ele, o Autor formulou.
De acordo com o
alegado, o Recorrente sufraga, fundamentalmente, o seguinte:
a) A
sentença do tribunal a Quo fez uma incorreta
interpretação dos artigos 7º do código do registo predial, e artigo 350º do
código civil, permitindo que o direito registal publicite uma situação sem nexo
com a realidade.
b) Dos
depoimentos das testemunhas não brota provas bastantes que o terreno tinha sido
ocupado desde 1980 e nem que a construção do barracão tenha ocorrido em 1996.
c)
Da
réplica do Apelante consta um facto não indicado na P.I., pelo que o mesmo
devia ser aceite como resposta a contestação do R, ora Recorrido, no despacho
saneador.
d) A
presunção do art. 7.º do Código do Registo Predial não pode aproveitar ao
Recorrido, logo não há inversão do ónus da prova. Continua a caber ao Recorrido
a prova dos factos constitutivos do direito que alega ser seu e que levou a
registo, uma vez que, por um lado, a doação verbal de Zacarias não é passível
de ser provada e, por outro lado, não se preenche o requisito do decurso do
tempo para aquisição por Usucapião.
e) É
notório, e reconhecido pelo Tribunal a
quo, que ainda não decorreu o prazo para aquisição pelo Recorrido do
terreno por usucapião.
f) Parafrasear
o Professor Menezes Cordeiro: são nulos todos os factos sustentados por uma
escritura de justificação notarial que enferma de falsidades – o chamado efeito
de contaminação.
Esta Contra-Alegação
destina-se a evidenciar que os argumentos utilizados pelo Recorrente são
contrários aos factos provados e são desprovidos de fundamentação idónea, o que
só confirma que com a interposição deste recurso se pretende protelar o
desfecho da acção, adiando uma decisão perfeitamente justa.
A total falta da razão do recorrente é captado diretamente: da ênfase que deu à solução seguida no Acórdão de
Uniformização da Jurisprudência do STJ de 4 de
Dezembro de 2007, processo nº 07A2464,
citado por ele nas suas alegações, no parágrafo 56°, por pensar que o tribunal
ad quem está obrigado a decidir em conformidade com a jurisprudência
uniformizada sob pena da ilegalidade da decisão, ora persiste a doutrina mais
atenta e esclarecida do Professor Doutor Rui Pinto segundo a qual, «qualquer
tribunal pode não seguir o acórdão uniformizador, ainda que a causa seja
idêntica. A decisão só vincula o tribunal a quo, todavia o que sucede é que a
subsequente decisão poderá ser recorrível nos termos do artigo 678, nº 2, al.
c)». (In Rui Pinto, elementos de processo
recursal, 2010, pág. - 209).
Importa frisar que ao invés dos anteriores assentos
(que vigoraram até 31 de Dezembro de 1996), o acórdão de uniformização da
jurisprudência não tem a força vinculativa, tem é a força/efeito persuasivo
qualificado na opinião de Brites Lameiras. Duma
forma indireta a tal falta de razão é assacado: da redacção que deu as conclusões das
alegações do seu recurso. Se não vejamos:
1
- Do Despacho Saneador
1.1- Alega
o Recorrente contra o desentranhamento da réplica, com o fundamento que da
réplica constava um facto essencial à causa, não alegado na petição inicial, isto é,
o Despacho Seneador deve ser revogado na parte em que não admitiu a réplica, e,
em consequência, ser substituído por outro que admita a réplica apresentada,
anulando-se todos os actos posteriores à prolação dessa decisão, incluindo a
matéria de facto por a mesma não ter tido em conta a matéria alegada na réplica
em respeito ao art. 715º, nº2 do CPC (cfr ponto 21 da alegações do recurso).
Ora em consonância com a
observação irrepreensível e bem demarcada do tribunal a quo: o Autor,
ora Recorrente não demonstrou qualquer facto constitutivo do direito sobre o
mesmo prédio rústico, nem se quer se afigura perceptível na sua P.I. querendo
com isso dizer que o Autor não alegou factos bastantes, nem deles fez a prova
da pudesse deduzir a existência de qualquer negócio válido ou aquisição originária
a seu favor. Repare que nem se quer falou da sua eventual ocupação, melhor
dizendo, da sua ligação
possessória, a partir de 1980, ao prédio na sua globalidade - o que furtaria
também por este lado qualquer tutela à sua posição.
Posto isto conclui-se que
o Apelante não é se quer detentor, nem possuidor e muito menos proprietário,
tanto assim que nem se aventurou a começar por acção da revindicação constante
do artigo art.° 1311, nº 1. No fundo nem lhe é permitido lançar a mão dos
institutos da acção directa ou da restituição da posse, art. 1277° conjugado
com 336° e respectivamente art. 1278°, ambos do Código Civil.
Acresce à isso tudo o
facto de, na réplica, o apelante limitar-se a reafirmar o que já dissera na sua
P.I., constituindo um «copy & paste» se quiser, um mero repositório da
matéria que já era objecto dos Autos, desrespeitando assim os limites plasmado
no art° 502 para a admissibilidade da réplica.
O douto despacho
que rejeitou a réplica e ordenou o respectivo desentranhamento, objecto de recurso,
é absolutamente exemplar, não merecendo qualquer reparo: a decisão é
inquestionável; a respectiva fundamentação clara e inequívoca.
1.2-
Alega o apelante (no ponto 13 da alegação) que
“o Tribunal a quo deveria ter feito uso da faculdade concedida pelo artigo
508.º, n.º 1, alínea a) – sobre as exceções e 511.º do Código de Processo Civil
– sobre a selecção de matéria de facto levado à base instrutória. Ora,
perfilhamos o entendimento da doutrina e jurisprudência maioritária segundo
qual: cabe ao Juiz, na fixação da base instrutória, seleccionar matéria de
facto relevante para a decisão da causa, contudo o nº 2 do art.° 511 permite as
partes reclamarem contra a selecção da matéria de facto, mas a verdade é que
uma vez proferido o despacho sobre a mesma reclamação apenas poderão ser
impugnado no recurso interposto da decisão final.
2
– Da Sentença Final
2-1- O Apelante pediu que
fosse declarada nula a Escritura de Justificação Notarial (com fundamento em
sua falsidade) e ordenado o cancelamento de quaisquer inscrições registais
operadas com base na mesma escritura.
2-1.1-
Ora, a falsidade das afirmações dos
outorgantes não figura entre as causas típicas de nulidade dos actos notariais,
previstas nos artigos 70.º e 71.º do Código do Notariado, motivo pelo qual o
pedido do Apelante está votado ao insucesso, fundamentalmente porque mesmo em
termos doutrinários o fundamento referido pelo recorrente no ponto
imediatamente acima, personificado em Menezes Cordeiro, constitui a tese
minoritária.
2-1.2-Está em causa
neste recurso, essencialmente, a pretensão do recorrente no sentido de que
tendo efectuado o registo do prédio em discussão, com base numa escritura
notarial de justificação da aquisição daquele por usucapião, beneficia da
presunção da titularidade prevista no artigo 7º do Código de Registo Predial,
apesar de ser objecto desta acção a impugnação da referida escritura de
justificação notarial.
2-1.3-O instituto da
justificação notarial consiste num expediente técnico simplificado de titulação
de facto com vista ao seu ingresso no registo, na falta de título mais idóneo,
tal como resulta da origem histórica deste instituto – Lei nº 2049 de
6-08-10951, Decreto-Lei nº 40603 de 18-05-1956 a que sucedeu o regime actual
dos arts.89º, 101º do Cód. do Notariado e art. 116º, nº 1 do Cód. de Registo
Predial. Por seu turno o art. 7º deste último diploma legal estipula que o
registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao
titular inscrito.
2-1.4-Este
dispositivo não contém qualquer restrição e, por isso, caso seja efectuado o
registo do facto justificado pela escritura de justificação predial, o titular
inscrito goza da referida presunção mesmo na acção em que seja impugnado o
facto justificado, isto porque a escritura de justificação é para estabelecimento ou
reatamento do trato sucessivo (art. 116 do CRP).
2-1.5-Em
meu entender, o recorrido sempre beneficiou da presunção decorrente do registo
que o recorrente não infirmou, na medida em que o
afastamento de uma presunção legal só pode ter lugar através da prova de factos
que a contrariem - cfr. Pires de Lima e
Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª edição, pgs. 312-313.
2-1.6-Caso
adotasse a solução contrária ficaria sem conteúdo útil a disposição do art.
101º, nº 2 do Cód. do Notariado que estipula que após a celebração da escritura
se não possa extrair certidão da mesma antes de decorrido o prazo de trinta
dias contados da publicação do extracto da mesma escritura e desde que nesse
prazo não seja recebida a comunicação da pendência de acção de impugnação
daquela. Assim, a escritura é
publicada por extracto (artigo 100º nº1 CN) e, no prazo de 30 dias contados da
publicação, os interessados podem proceder à impugnação judicial do facto
justificado. (nº2 do citado artigo 100º).
2-1.7-Ora o prazo de 30 dias visou
retardar a realização de qualquer registo fundado na escritura a fim de
possibilitar que eventual impugnação de algum interessado seja previamente
dirimida no foro judicial. Decorrido o prazo sem que o notário receba
comunicação da pendência de impugnação, pode ser passada certidão da escritura,
deixando de haver obstáculo ao respectivo registo.
2-1.8- Tratando-se de uma escritura
pública, é um documento autêntico - "ex vi" do disposto nos artigos
369º do Código Civil e 35º nº 2 do Código do Notariado - faz prova plena não só
dos factos praticados pelo respectivo oficial público - notário - como dos
factos atestados com base nas suas percepções. A força probatória material
só pode ser ilidida pela via da falsidade nos termos do nº1 do artigo 372º do
Código Civil, que conduz à prova do contrário, e não apenas à simples
contraprova.
2-1.9-Se com ou sem
registo, o Justificante não beneficiasse da respectiva presunção decorrente do
registo, não haveria razão para a exigência daquele hiato temporal, pois, então
bastaria que a lei impedisse a passagem da certidão antes de ser comprovado a
publicação do extracto da escritura. Logo o entendimento contrário ao nosso
viola o disposto no nº 3 do art. 9º do Cód. Civil.
2-1.10-Por outro lado,
também não é acatado o argumento geralmente apontado, no qual a solução legal
aqui defendida é perigosa para o comércio jurídico por permitir que com base
numa simples escritura notarial contendo o depoimento de três testemunhas, sem
qualquer controlo contraditório ou judicial, fosse possível um qualquer sujeito
beneficiar da presunção decorrente do registo.
2-1.11-Com efeito, o estabelecimento do
instituto em causa visou, como já dissemos, satisfazer prementes necessidades
de ordem prática ponderando o legislador na sua institucionalização esses
perigos que considerou serem menores quando confrontados com os benefícios
decorrentes da adopção daquele regime legal. Além disso, as pessoas que
fraudulentamente usem esse instituto estarão sujeitas às sanções legais, mesmo
de ordem penal, que as desencorajam, em regra, dessa prática ilegal.
2-1.12-Acresce a isto a possibilidade de
o gozo da referida presunção legal poder ser afastada, pois se trata de presunção iuris tantum, e, portanto,
passível de ser contrariada por prova em contrário.
2-1.13-Só que, com o registo, deixa de haver a situação
de incerteza que é
pressuposto desse tipo de acção e passa a haver uma situação de agressão
concreta a um direito de outrem, pelo que só uma acção de condenação, afirmando
uma realidade real diferente
da realidade registal, pode
pôr em causa esta última, afirmada pela presunção do art.7º do CRP.
2-1.14-Em jeito de conclusão reitera: somos
da opinião de que, como no caso dos Autos, o réu-justificante, ora recorrido
que efectuou o registo do prédio justificando com base na escritura de
justificação, por falta da atempada impugnação, beneficia da presunção
decorrente do registo, nos termos do artigo 7º do diploma legal supra citado.
Finalmente como o Apelante não provou o contrário
do que consta do registo, (isto é: não destruiu a presunção e nem invocou
factos que pudessem sobrepôr aos levados ao registo), a solução justa e
equitativa passa necessariamente por julgar improcedente o pedido do Recorrente.
2-2- Alega ainda, o Apelante, que cabe
ao Recorrido a prova dos factos constitutivos do direito de propriedade, não
podendo a presunção constante do art. 7.º do CRP, aproveitar ao Recorrido uma
vez que a acção de impugnação, em causa, é uma acção de simples apreciação
negativa (arts. 4.º, n.º 2, al. a) e 343.º, n.º 1 do CPC).
2-2.1- Em lógico corolário, incumbirá ao autor,
por seu turno, a prova dos respectivos factos impeditivos, modificativos ou
extintivos, sendo uma das funções da réplica nesse tipo de acções, exactamente,
o cumprimento do ónus de alegação destes factos, tal como preceitua o n.º 2 do
art. 502 do CPC. Isto significa que a acção de declaração negativa se assimila
à natureza dos antigos «juízos de jactância» (provocatio ad agendum et
probandum), passando o autor formal a réu em sentido material, e o réu formal a
autor material.
2-2.2-É precisamente pelo facto de a réplica assumir nas acções em
apreço a função da contestação, é que o prazo de apresentação deste articulado,
de 15 dias nas demais acções, foi aumentado, tratando-se de acção de simples
apreciação negativa, para 30 dias (n.º 3 do artigo 502.º), o prazo normal,
justamente, da contestação em processo ordinário (artigo 486.º, n.º 1.
2-2.3-Dispõe no mesmo sentido e
clarividencia o acórdão da RP de 02/04/87, de cujo sumário se respiga:
"a inscrição registal dispensa o titular inscrito de provar o facto em que
se funda a presunção derivada do registo, isto é, que o direito existe e existe
na sua titularidade. Para conseguir a elisão da presunção legal derivada do
registo, há que provar (e para isso alegar) os factos demonstrativos de que a
titularidade da propriedade inscrita não corresponde minimamente à verdade - e
tal ónus incumbe ao impugnante do registo"
2-2.4-Ou seja ao
contrário do que é alegado pelo Apelante, era a este que incumbia alegar e
provar factos susceptíveis de ilidir a presunção do art. 7.º, CRP, de que o
Recorrido beneficiava por ter efectuado o registo do seu direito com base na
escritura de justificação notarial, o que o recorrente não logrou fazer.
2-2.5-A presente acção de justificação é
habitualmente classificada como de simples apreciação negativa, pelo que o ónus
de prova se inverte, nos termos do art. 343º, nº 1 do Cód. Civil. Porém
beneficiando o aqui réu da presunção decorrente do registo, nos termos do art.
344º, nº 1 do Cód. Civil, volta o ónus de prova a caber aos aqui ao Autor
impugnante do facto justificado.
2-2.6-Por conseguinte
repescamos a posição do Ministério Público, sobre esta matéria, no Acórdão de
Uniformização da Jurisprudência de STJ de 4 de Dezembro de 2007, processo nº
07A2464, segundo a qual: Na acção de
impugnação de facto justificado notarialmente e inscrito definitivamente no
registo, incumbe ao autor ilidir, mediante prova em contrário, a presunção de
que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que
o registo o define, face às disposições conjugadas dos artigos 7º, 8º, 10º,
116, nº 1 do Código de Registo Predial, 344º, nº 1 e 350º do Código Civil”, pelo
que o Acórdão recorrido deve ser mantido no concernente a esta questão.
3 – Da Posse
3.1-
O
conceito da Posse resulta do Código Civil, concretamente no, livro III, artigo
1251.° onde lê-se que a Posse é o
poder
que se
manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito
de propriedade ou de outro direito real”.
3.2-
Convém
frisar que a concepção subjectiva e posse consagrada nos artigos 1251º e 1253º
do CC foi formulada por Savigny,
onde a posse é integrada por dois elementos: o corpus (o
elemento material, que consiste no domínio de facto sobre a coisa, ou seja, no
exercício efectivo de poderes materiais sobre ela ou na possibilidade física
desse exercício); e o animus possidendi (elemento
psicológico, que consiste na intenção de exercer sobre a coisa o direito correspondente
àquele domínio de facto.
3.3- Ora, segundo a melhor doutrina: “ entre
nós está acolhida a posição subjectivista”, porque “dos artigos 1251 e 1253
verifica-se que a posse exige o corpus
e o animus: se faltar o animus possidendi, estamos perante
uma mera detenção ou posse precária”. Cfr. Mota Pinto in, “direitos reais”,
Almedina, 1971, pp. 189,190.
3.4- In casu poder-se-á aferir, dos elementos
dados como provados na decisão final, que o R. usufruía do terreno, preenchendo
o corpus necessário para a existência de posse e em simultâneo o animus, ou
seja a intenção de actuar como o seu legítimo proprietário.
3.5- Ficou
fundamentalmente comprovado que essa posse foi adquirida sem violência, de boa fé e mantida sem
oposição, ostensivamente, com conhecimento de toda a gente e com aproveitamento
de todas as utilidades do prédio, agindo sempre por forma correspondente ao exercício
do direito de propriedade, quer usufruindo como tal o imóvel, quer suportando
os respectivos encargos.
3.6- Acresce ainda
o facto de esta posse ser em nome próprio,
pacífica, contínua e pública, conduzindo assim a aquisição do imóvel, por usucapião, que invoca, justificando
o direito de propriedade, para o efeito de registo, dado que esta forma de
aquisição não pode ser comprovada por qualquer outro título formal
extrajudicial. Pelos segundos outorgantes foi dito que confirmaram as declarações que
antecedem, por corresponderem inteiramente à verdade.
3.7- Levando em linha de conta tudo acima referido a solução
não pode ser outra, quer dizer que toda a actuação de R. consubstancia um caso
típico da posse efectiva, pelo que o tribunal ad quem deve julgar improcedente
todas alegações do recorrente e manter a decisão sob censura.
4 - Do Tempo
Da
Usucapião:
4.1- Alega
também o Apelante, que não decorreu o período de tempo suficiente para que
possa ocorrer a usucapião.
4.2- A verificação da
usucapião depende de dois elementos: a posse e o decurso de certo
período de tempo (art. 1287.º, Cód. Civil). Especificamente os prazos são de quinze e vinte anos, contados desde o início de posse respectivamente se o
possuidor estiver de boa ou de má-fé nos termos do art. 1296º do CC.
4.3-
Urge considerar que a usucapião
constitui o fundamento primário dos direitos reais na nossa ordem jurídica, não
podendo esquecer-se que a base de toda a nossa ordem imobiliária não está no
registo, mas na usucapião (Oliveira Ascensão, Efeitos Substantivos do Registo
Predial na Ordem Jurídica Portuguesa, ROA, Ano 34, pág. 43/46). E o art. 101º,
nº1, do Cód. do Notariado, não fixa qualquer prazo para propositura da acção de
impugnação do facto justificado.
4.4-
Feitas as contas, descobre-se que existe
não só a posse, reitero – de boa fé, como também o decurso de prazo mais que
suficiente, sem embargo da interrupção ora alegado, se não vejamos:
→ Da data de doação verbal (1980) à data da outorga da
escritura de justificação notarial (2007) passaram vinte e sete anos.
→ Sendo a posse de boa-fé, só necessitava de 15 anos e ainda
que assim o tribunal ad quem não entendesse só ia precisar de mais 5 anos para
beneficiar da posse de má-fé.
→ Mesmo
que se considerasse a data da morte de Zacarias como a do início da posse,
teriam, até 2007, na mesma passado vinte e dois anos - tempo suficiente para a
aquisição por usucapião.
4.5-
Em abono de todos os fundamentos acima
mencionado, adicionamos a circunstância de a própria sentença do tribunal à quo
ter confirmado no ponto 2.2, VIII e IX que antes da data da morte de Zacarias o
recorrido já tinha entrado na posse e fruição do terreno em nome próprio e que
a tal posse já tinha sido adquirida há mais de vinte anos sem interrupção ou
ocultação de quem quer que seja.
4.6-
Provou a prática reiterada sobre o
prédio, por mais de 20 anos, de actos materiais de cultivo (plantação de
árvores, cultivo da terra, poda das fruteiras, colheita dos frutos) exercidos
publicamente e pacificamente. Pelo prazo, pela publicidade, pela ininterrupção
e reiteração, não haveria obstáculos à proclamada usucapião (1296º, CC).
4.7-
Deste modo o fundamento do presente
recurso deveria ser julgado totalmente improcedente, mantendo o decidido na
sentença recorrida.
Conclusões:
I
-
Está o Recorrido dispensado de efectuar
a prova dos factos que levaram à usucapião, em virtude da presunção do art.
7.º, CRP, e em virtude de esses factos, no caso concreto, terem sido alegados
em juízo e constarem da escritura de justificação notarial que serve de base ao
registo.
II
-
Caso o Tribunal ad quem considere não existirem factos suficientes quer
na escritura, quer alegados na acção, para fundarem a usucapião, deverá o
presente recurso improceder.
III
-
Não deve a decisão que desentranhou a réplica ser revogada, na medida em
que nessa peça, Apelante se limita a reafirmar o que já dissera na sua petição inicial,
constituindo uma mera repetição ou repositório de matéria que já era objecto
dos autos, não cumprindo assim, os limites estabelecidos para a admissibilidade
da réplica, constantes dos art. 502.º do CPC.
IV
-
De acordo com a posição
sustentada, o Acórdão uniformizador não constitui um parâmetro à actuação do
tribunal ad quem, pelo que deixa margem para uma decisão inovadora, certeira,
equitativa e actualizada.
V
-
Decorrido o prazo de impugnação da escritura de justificação notarial sem
que a ela tenha havido lugar, isto é, cumprida que seja a fase da publicidade da
respectiva outorga e inscrita a aquisição do direito, como é o caso, passa esta
inscrição a constituir a presunção da titularidade do direito em causa, nos
termos do artigo 7.º, CRP.
VI
-
O Recorrido goza da presunção decorrente da inscrição registal do seu direito
(art. 7.º, CRP), presunção esta que determina a inversão da regra anterior, desonerando-o
de provar os factos constitutivos do seu direito, afastando a obrigação que lhe
cabia por força do art. 343.º, n.º 1 do Cód. Civil.
VII
-
Por virtude da mencionada presunção com a consequente dispensa do ónus
da prova dos factos constitutivos do direito que o Recorrido se arroga, o ónus
de prova da falsidade da mencionada escritura de justificação notarial, ou
seja, de que o direito nela declarado não existe, passa a pertencer ao
Autor/Apelante (artigos 342.º, nº 1, 344.º, nº 1 e 350.º, Cód Civil e 7.º,
CRP).
VIII
- Como o Apelante não logrou ilidir essa
presunção, não tendo feito a prova do contrário, cabendo-lhe essa prova, deve o
seu pedido ser julgado improcedente, nos termos dos arts. 516.º do CPC e 347.º
e 350.º, n.º 2 do Cód. Civil.
IX
-
Das circunstancias do caso, no global, não resta dúvidas que o recorrido
detinha a posse de boa fé e que tinha decorrido o prazo suficiente para
beneficiar da propriedade por via da usucapião, uma vez que a sua actuação consubstancia um caso típico da posse efectiva .
Por tudo o exposto, e sem necessidade de mais amplas
considerações, deverá a presente apelação ser julgada
improcedente, por não provada, e, consequentemente, confirmar a decisão
proferida pelo tribunal a quo com todos efeitos legais, justamente porque não violou quaisquer preceitos legais, "maxime" os mencionados
pelo recorrente.
O advogado,
Ricardo
Vicente
DONE
BY: Ricardo Vicente Lima
da Costa e Silva.
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