A propósito do dia Internacional dedicado à Mulher, que se comemora amanhã em todo mundo, sendo uma data importante e pertinente para reflexão, sentimo-nos no dever civil de fazer uma análise crítica sobre o tratamento injusto que as mulheres guineenses são confrontadas no seu dia-a-dia, não dispondo de quaisquer tipos de alternativas e meios de defesa para fazer valer os seus direitos.
Como temos assistido ao longo dos tempos, e que ainda persiste nos nossos dias, há uma diferença abismal no tratamento entre o homem e a mulher, que uma pessoa que prese pelos Direitos Humanos jamais poderá aceitar. E é justamente sobre esse fosso de separação que concentraremos a nossa reflexão, procurando na medida do possível descortinar aquilo que, a nosso ver, consideramos ser um dos males e causas de injustiças praticados contra a dignidade da mulher, particularmente no contexto específico do nosso país, a Guiné-Bissau.
Para falar da integração da mulher guineense na nossa sociedade, é preciso ter uma visão holística daquilo que são as matrizes e pressupostos valorativos que caracterizam a sociedade guineense. E isto conduz-nos, desde logo, a fazer um enquadramento sociocultural para poder ter uma noção real da discriminação que as mulheres são alvos diariamente.
Com efeito, este enquadramento sociocultural prende-se sobretudo com o facto da sociedade guineense ser composta por inúmeras mundividências, a começar no plano étnico, religioso e sociocultural que sumariamente analisaremos infra. Todos estes factores acabam por não contribuir em nada para a verdadeira integração das mulheres, mormente no que toca aos direitos fundamentais que lhes assistem e que ainda hoje continuam a ser-lhes flagrantemente negados pelas nossas autoridades, que são:
a) Em primeiro lugar, a diversidade étnica, baseada nos poderes autóctones que limitam significativamente a intervenção do Estado na concretização do Estado de Direito Democrático na esfera jurídica das pessoas. Como se sabe, a maioria destas etnias na Guiné-Bissau firmam as suas crenças na supremacia do homem face a mulher que já vinha de tradições mais remotas herdadas pelos nossos antepassados.
b) Em segundo lugar, a ordem religiosa destaca-se também como um dos factores de acentuação das desigualdades e injustiças sociais cometidas contra as mulheres, sobretudo no que toca à submissão total da mulher em relação ao marido e certos privilégios que somente são reservados a estes. Os Animistas defendem essa concepção, juntamente com os muçulmanos (por mais que possam surgir objecções contrárias sobre isso, a forma como estas duas religiões encaram e tratam a mulher, é passível se extrair delas essa conclusão que acabámos de afirmar). Excepção são os cristãos, que têm uma postura diferente - embora não tão nítida como deveria ser a luz dos valores bíblicos – uma vez que "todos os homens são filhos de Deus e Cristo veio para todos salvar, a universalidade dos fundamentos e da mensagem cristã tem como consequência a afirmação de uma regra de igualdade entre todos os homens: tal como São Paulo afirma na sua Epístola aos Gálatas, “não há judeu, nem grego; não há servo, nem livre; não há homem, nem mulher", escreve o Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Paulo Otero, in "Instituições Políticas e Constitucionais", Volume I, pág. 97.
c) Em terceiro lugar, o plano sociocultural, que assenta na tradição de usos e costumes (este último caracterizado por prática reiterada com convicção de obrigatoriedade) que a sociedade guineense imana e incorpora no seu seio (como qualquer outra sociedade) e com as suas variadas tendências para um "machismo sem precedentes", que consubstancia manifestamente uma cultura retrograda/antiquada de machundadi, que consiste nomeadamente no não reconhecimento da regra de igualdade entre o sexo feminino e sexo masculino. Toda essa dura realidade, acaba por ter repercussões e consequências negativas na forma de ver e considerar a figura da mulher na nossa sociedade.
Feito este brevíssimo enquadramento cultural, estamos agora na altura necessária de poder enumerar directamente os grandes problemas, ou se preferir desafios que, a nosso ver, se colocam ainda hoje às nossas mulheres guineenses – nô padiduris.
No nosso entendimento, os problemas/desafios prendem-se com as seguintes ordens: a violência doméstica, a desprotecção legal, a injustiça social e do mercado laboral, o não acesso à educação, a ofensa à integridade física e psicológica, que engloba a prática da mutilação genital e o casamento forçado a que a maioria é submetida em nome da religião ou tradição, a mortalidade materna, o flagelo de HIV, que cada vez mais está a propagar de forma drástica na camada di nô mindjeris.
Todos estes gritantes e evidentes males cometidas contra as mulheres, que não têm merecido uma atenção especial dos nossos sucessivos governantes (pelo menos, por enquanto), violam flagrantemente os Princípios e Valores consagrados na Declaração Universal dos Direitos do Homem, que a Guiné-Bissau ratificou e adoptou na sua Constituição da República, conhecidos como direitos irrenunciáveis e inderrogáveis a qualquer pessoa humana, visto que são conjuntos de direitos inatos ao Homem que configuram os chamados Direitos Fundamentais, transcendendo o próprio Estado na sua actuação com os cidadãos; insusceptíveis de quaisquer tipos de violações.
Perante tudo o que ficou exposto, levanta-se a pertinente questão: como é que a sociedade guineense pode responder positivamente estas graves discriminações contra as mulheres? A resposta não podia ser mais do que taxativa por razões óbvias, dado que todos nós sabemos o que deve ser feito para resolver cabalmente essa vergonhosa situação nacional, inclusive as próprias autoridades. Acontece que os discursos que temos assistido por parte dos nossos sucessivos governantes sobre este assunto não passam mais de discursos tautológicos, que visam única e exclusivamente engodar a opinião pública e consequentemente continuar adiar o real combate deste flagelo ameaçador da nossa sociedade, sem fim à vista.
Afirmamos isto de viva convicção, porque há um desinteresse total do Estado perante tais abusos. Basta vermos as lacunas legislativas existentes que temos, e a impunidade total sobre constantes violações que as mulheres sofrem diariamente sem praticamente resultar em nada, para compreendermos que de facto estamos ainda muito longe de superar estes males. Por outras palavras, o Estado Guineense mostra-se “cego” e incapaz perante uma realidade cognoscível a todos e fácil de resolver.
Para acabar definitivamente com essa marginalização das nossas mulheres, é preciso que o Estado guineense assuma de facto as suas responsabilidades e reforce o seu papel interventivo na esfera jurídica das pessoas, através de mecanismos exequíveis, que visem colmatar na íntegra as injustiças praticadas contra as mulheres, desde logo criar condições necessárias do acesso à boa educação (escola) e fazer leis punitivas mais severas para criminalizar todos os abusos que ofendem a dignidade da mulher (a começar com a prática da mutilação genital, violência doméstica, casamento forçado, descriminação laboral etc.).
Se as nossas autoridades proporcionarem condições dignas para a maioria das nossas mulheres se aculturarem, obviamente que isso terá um reflexo bastante positivo: contribuirá decisivamente para melhorar e reduzir muitos dos abusos cometidos contra elas, bem como ajudá-las a lidar e defender, da melhor forma, as doenças infecto-contagiosas, gravidezes precoces e indesejadas, que continuam ainda atingir a maioria; e possibilitar ainda o acesso a um emprego condigno. Tudo isto terá certamente um impacto positivo na nossa sociedade, e, em consequência disso, equilibrar a balança no tratamento dos dois géneros.
Esperamos que num futuro recente/breve estas nossas aspirações – que não deixam de ser também as legítimas aspirações de todas as mulheres guineenses – possam ser atendidas pelas nossas autoridades; e que todos nós, homens e mulheres, acima de tudo guineenses, possamos viver de facto em espírito de Igualdade, Harmonia e Progresso para o bem-estar de todos.
Queremos ainda, do íntimo do nosso ser, desejar muitos parabéns a todas as mulheres guineenses, especialmente por aquelas que estão a passar por diversas adversidades, incluindo as supra mencionadas ou em qualquer outro tipo de situação e contexto em que possam estar inseridas. Os nossos sinceros parabéns, pela vossa coragem e valentia! Um feliz dia da mulher!
(Pensamento de Térsio Vieira, extraído in blog "As Verdades").
Como temos assistido ao longo dos tempos, e que ainda persiste nos nossos dias, há uma diferença abismal no tratamento entre o homem e a mulher, que uma pessoa que prese pelos Direitos Humanos jamais poderá aceitar. E é justamente sobre esse fosso de separação que concentraremos a nossa reflexão, procurando na medida do possível descortinar aquilo que, a nosso ver, consideramos ser um dos males e causas de injustiças praticados contra a dignidade da mulher, particularmente no contexto específico do nosso país, a Guiné-Bissau.
Para falar da integração da mulher guineense na nossa sociedade, é preciso ter uma visão holística daquilo que são as matrizes e pressupostos valorativos que caracterizam a sociedade guineense. E isto conduz-nos, desde logo, a fazer um enquadramento sociocultural para poder ter uma noção real da discriminação que as mulheres são alvos diariamente.
Com efeito, este enquadramento sociocultural prende-se sobretudo com o facto da sociedade guineense ser composta por inúmeras mundividências, a começar no plano étnico, religioso e sociocultural que sumariamente analisaremos infra. Todos estes factores acabam por não contribuir em nada para a verdadeira integração das mulheres, mormente no que toca aos direitos fundamentais que lhes assistem e que ainda hoje continuam a ser-lhes flagrantemente negados pelas nossas autoridades, que são:
a) Em primeiro lugar, a diversidade étnica, baseada nos poderes autóctones que limitam significativamente a intervenção do Estado na concretização do Estado de Direito Democrático na esfera jurídica das pessoas. Como se sabe, a maioria destas etnias na Guiné-Bissau firmam as suas crenças na supremacia do homem face a mulher que já vinha de tradições mais remotas herdadas pelos nossos antepassados.
b) Em segundo lugar, a ordem religiosa destaca-se também como um dos factores de acentuação das desigualdades e injustiças sociais cometidas contra as mulheres, sobretudo no que toca à submissão total da mulher em relação ao marido e certos privilégios que somente são reservados a estes. Os Animistas defendem essa concepção, juntamente com os muçulmanos (por mais que possam surgir objecções contrárias sobre isso, a forma como estas duas religiões encaram e tratam a mulher, é passível se extrair delas essa conclusão que acabámos de afirmar). Excepção são os cristãos, que têm uma postura diferente - embora não tão nítida como deveria ser a luz dos valores bíblicos – uma vez que "todos os homens são filhos de Deus e Cristo veio para todos salvar, a universalidade dos fundamentos e da mensagem cristã tem como consequência a afirmação de uma regra de igualdade entre todos os homens: tal como São Paulo afirma na sua Epístola aos Gálatas, “não há judeu, nem grego; não há servo, nem livre; não há homem, nem mulher", escreve o Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Paulo Otero, in "Instituições Políticas e Constitucionais", Volume I, pág. 97.
c) Em terceiro lugar, o plano sociocultural, que assenta na tradição de usos e costumes (este último caracterizado por prática reiterada com convicção de obrigatoriedade) que a sociedade guineense imana e incorpora no seu seio (como qualquer outra sociedade) e com as suas variadas tendências para um "machismo sem precedentes", que consubstancia manifestamente uma cultura retrograda/antiquada de machundadi, que consiste nomeadamente no não reconhecimento da regra de igualdade entre o sexo feminino e sexo masculino. Toda essa dura realidade, acaba por ter repercussões e consequências negativas na forma de ver e considerar a figura da mulher na nossa sociedade.
Feito este brevíssimo enquadramento cultural, estamos agora na altura necessária de poder enumerar directamente os grandes problemas, ou se preferir desafios que, a nosso ver, se colocam ainda hoje às nossas mulheres guineenses – nô padiduris.
No nosso entendimento, os problemas/desafios prendem-se com as seguintes ordens: a violência doméstica, a desprotecção legal, a injustiça social e do mercado laboral, o não acesso à educação, a ofensa à integridade física e psicológica, que engloba a prática da mutilação genital e o casamento forçado a que a maioria é submetida em nome da religião ou tradição, a mortalidade materna, o flagelo de HIV, que cada vez mais está a propagar de forma drástica na camada di nô mindjeris.
Todos estes gritantes e evidentes males cometidas contra as mulheres, que não têm merecido uma atenção especial dos nossos sucessivos governantes (pelo menos, por enquanto), violam flagrantemente os Princípios e Valores consagrados na Declaração Universal dos Direitos do Homem, que a Guiné-Bissau ratificou e adoptou na sua Constituição da República, conhecidos como direitos irrenunciáveis e inderrogáveis a qualquer pessoa humana, visto que são conjuntos de direitos inatos ao Homem que configuram os chamados Direitos Fundamentais, transcendendo o próprio Estado na sua actuação com os cidadãos; insusceptíveis de quaisquer tipos de violações.
Perante tudo o que ficou exposto, levanta-se a pertinente questão: como é que a sociedade guineense pode responder positivamente estas graves discriminações contra as mulheres? A resposta não podia ser mais do que taxativa por razões óbvias, dado que todos nós sabemos o que deve ser feito para resolver cabalmente essa vergonhosa situação nacional, inclusive as próprias autoridades. Acontece que os discursos que temos assistido por parte dos nossos sucessivos governantes sobre este assunto não passam mais de discursos tautológicos, que visam única e exclusivamente engodar a opinião pública e consequentemente continuar adiar o real combate deste flagelo ameaçador da nossa sociedade, sem fim à vista.
Afirmamos isto de viva convicção, porque há um desinteresse total do Estado perante tais abusos. Basta vermos as lacunas legislativas existentes que temos, e a impunidade total sobre constantes violações que as mulheres sofrem diariamente sem praticamente resultar em nada, para compreendermos que de facto estamos ainda muito longe de superar estes males. Por outras palavras, o Estado Guineense mostra-se “cego” e incapaz perante uma realidade cognoscível a todos e fácil de resolver.
Para acabar definitivamente com essa marginalização das nossas mulheres, é preciso que o Estado guineense assuma de facto as suas responsabilidades e reforce o seu papel interventivo na esfera jurídica das pessoas, através de mecanismos exequíveis, que visem colmatar na íntegra as injustiças praticadas contra as mulheres, desde logo criar condições necessárias do acesso à boa educação (escola) e fazer leis punitivas mais severas para criminalizar todos os abusos que ofendem a dignidade da mulher (a começar com a prática da mutilação genital, violência doméstica, casamento forçado, descriminação laboral etc.).
Se as nossas autoridades proporcionarem condições dignas para a maioria das nossas mulheres se aculturarem, obviamente que isso terá um reflexo bastante positivo: contribuirá decisivamente para melhorar e reduzir muitos dos abusos cometidos contra elas, bem como ajudá-las a lidar e defender, da melhor forma, as doenças infecto-contagiosas, gravidezes precoces e indesejadas, que continuam ainda atingir a maioria; e possibilitar ainda o acesso a um emprego condigno. Tudo isto terá certamente um impacto positivo na nossa sociedade, e, em consequência disso, equilibrar a balança no tratamento dos dois géneros.
Esperamos que num futuro recente/breve estas nossas aspirações – que não deixam de ser também as legítimas aspirações de todas as mulheres guineenses – possam ser atendidas pelas nossas autoridades; e que todos nós, homens e mulheres, acima de tudo guineenses, possamos viver de facto em espírito de Igualdade, Harmonia e Progresso para o bem-estar de todos.
Queremos ainda, do íntimo do nosso ser, desejar muitos parabéns a todas as mulheres guineenses, especialmente por aquelas que estão a passar por diversas adversidades, incluindo as supra mencionadas ou em qualquer outro tipo de situação e contexto em que possam estar inseridas. Os nossos sinceros parabéns, pela vossa coragem e valentia! Um feliz dia da mulher!
(Pensamento de Térsio Vieira, extraído in blog "As Verdades").
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